EM MINAS

Tigrinho solto, Senado em fogo e mineiros sem protagonismo

Não se trata de moralismo, mas de responsabilidade. Influenciadores, artistas, jogadores, todos lucram com um sistema que adoece, endivida e mata

Arte EM -  (crédito: Quinho/EM/D.A. Press)
Arte EM - (crédito: Quinho/EM/D.A. Press)

“Minas não inventa moda; Minas guarda segredo”. A frase talvez explique a cautela da política mineira. Mas, quando o estado lidera o consumo de apostas online no Brasil, o silêncio deixa de ser prudência e vira cumplicidade. Segundo o Portal do Comércio, o estado está entre os que mais movimentam o mercado de apostas, com impactos sociais diretos: R$ 68,2 bilhões gastos no país em um ano, 1,3 milhão de inadimplentes e R$ 1,1 bilhão arrancados do varejo só no primeiro semestre.

Apesar disso, a bancada mineira no Senado não assume protagonismo no combate a esse mercado, mesmo tendo opiniões contundentes. Não propõe projetos robustos, não articula frentes nem lidera a I das Bets.

Carlos Viana (PL), mais discreto, defende a imposição de restrições severas. Cleitinho (Republicanos) demonstra forte rejeição ao avanço das apostas online no Brasil. Já Rodrigo Pacheco (PSD) se silencia.
“Minha ideia é proibir totalmente a divulgação das apostas. Como isso não é possível, acredito que impor regras mais restritivas, como proibir propaganda feita por influenciadores e famosos, pode funcionar, assim como aconteceu com os cigarros no ado”, afirmou Viana à coluna.

Cleitinho considera o sistema uma “doença”, um “vício” que destrói famílias. Para ele, trata-se de algo que “não presta, é tudo de ruim junto”, uma visão que, embora não esteja estruturada em propostas, tem força retórica e apelo popular.

A agem do senador mineiro pela I das Bets foi, no mínimo, simbólica. Durante uma das sessões, pediu para tirar uma foto com a influenciadora Virgínia Fonseca, também de Minas, nascida em Governador Valadares e uma das principais promotoras de sites de apostas no país. Diante da reação negativa, ele se desculpou publicamente, gesto raro para alguém que costuma controlar a própria narrativa com mão firme.

Cleitinho é popular, fala o que o povo quer ouvir. Mas, quando há famílias endividadas, comida faltando no prato por causa de promessas falsas de dinheiro fácil, tirar foto com quem lucra promovendo esse tipo de ilusão pareceu fora de sintonia com a realidade.

Rodrigo Pacheco, ex-presidente do Senado, também foi procurado pela coluna, mas sua assessoria não respondeu. É o único que mantém o silêncio absoluto, até mesmo após a aprovação do projeto que proíbe influenciadores em propagandas de casas de apostas.

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A omissão não é gratuita. O estado tem base conservadora e políticos que medem cada o para não desagradar aliados, igrejas, clubes ou patrocinadores. Viana opina, mas não confronta. Cleitinho se manifesta, mas não articula. Pacheco silencia com foco no governo do Estado e o silêncio pesa.

Enquanto isso, o Tigrinho ruge no bolso das famílias. Cassinos digitais, como o Fortune Tiger, operam sem autorização da Fazenda e têm 60% do público formado por mulheres, justamente quem recebe os benefícios sociais. Perder aqui é empobrecer o lar. 

E as apostas não estão só nos stories: estão nos estádios. O Cruzeiro, por exemplo, é patrocinado pela Betfair; o Atlético-MG, pela H2Bet – o maior patrocínio da história do futebol mineiro. A aposta virou ídolo. Está no peito do time, no banco de reservas e nos olhos dos jovens.

 

Não se trata de moralismo, mas de responsabilidade. Influenciadores, artistas, jogadores, todos lucram com um sistema que adoece, endivida e mata. E o estado, onde tudo isso se espalha com força, segue calado.

Já foi diferente. Foi um mineiro, Venceslau Brás, quem assinou em 1917 o decreto que proibiu os jogos de azar no Brasil. À época, a justificativa era a desordem moral e econômica que o vício trazia ao cotidiano dos brasileiros. Décadas depois, em 1946, Eurico Gaspar Dutra confirmou a proibição dos cassinos, encerrando a chamada “era de ouro” dos jogos.

Entre um decreto e outro, o país viveu ciclos de legalização e repressão, mas, em todas essas fases, Minas teve papel central na defesa da ordem institucional. Era daqui que vinham os freios, os códigos, a ética.

Hoje, o ciclo se repete, sem freio, sem código, sem reação. As apostas se infiltraram na cultura, no futebol, na publicidade, nos algoritmos e a resposta política não acompanha o estrago social. Não há propostas legislativas em curso que enfrentem com profundidade o avanço das bets. Não há relatorias. Não há protagonismo. Há fala. Mas falta ação.

A mesma terra que já foi sinônimo de equilíbrio institucional hoje apenas observa, da arquibancada da omissão, um massacre social acontecer em silêncio. Como disse Carlos Drummond de Andrade, outro mineiro que sabia dos bastidores da alma: “A cada dia que vivo, mais me convenço de que o desperdício da vida está no amor que não damos, nas forças que não usamos, na prudência egoísta que nada arrisca.”

Este é o preço da neutralidade: não arriscar. E, por isso, perder. Jogar alto. Mas calar quando deveria gritar. 

Costura petista

A pré-candidatura do deputado estadual Ricardo Campos à presidência do PT em Minas está perto de ser retirada. A articulação nos bastidores prevê apoio à deputada Leninha (PT), vice da Assembleia Legislativa. Fontes próximas à parlamentar confirmaram ao EM que as conversas estão avançadas. Segundo interlocutores do partido, a reviravolta está ligada à possível troca de comando na Codevasf no Norte de Minas. O movimento abriria espaço para um indicado do grupo do deputado federal Paulo Guedes, aliado de Ricardo, na estatal. Em contrapartida, o grupo aria a apoiar Leninha. A mudança tem o respaldo de Gleide Andrade, secretária nacional de Planejamento e Finanças do PT e entusiasta da candidatura da deputada.

Dividiu o bloco

A articulação provocou reações internas. O vereador Pedro Rousseff, o ex-deputado Virgílio Guimarães e o dirigente nacional Romênio Pereira, que até então apoiavam Ricardo, romperam com o grupo e decidiram não aderir à aliança com Leninha. Em vez disso, aram a apoiar a deputada federal Dandara Tonantzin, cuja pré-candidatura já contava com o respaldo de Reginaldo Lopes e Marília Campos. Dandara, inclusive, antecipou sua vinda a Belo Horizonte para participar do anúncio. 

Tiro no pé?

A secretária nacional de Planejamento e Finanças do PT, Gleide Andrade, ou a ser alvo de críticas dentro do partido por sua atuação na disputa pelo comando estadual da sigla. Com apoio de nomes de peso como Beatriz Cerqueira, Leninha e Rogério Correia, Gleide tem visto seu prestígio interno diminuir. Parte dos filiados questionou a estratégia de unir forças em torno da candidatura de Leninha, em vez de manter três nomes competitivos na disputa. Para esses integrantes, a fragmentação poderia forçar um segundo turno e abrir espaço para um embate mais equilibrado com Dandara Tonantzin, favorita ao posto. Com o cenário polarizado, a avaliação de muitos é que Dandara pode vencer já no primeiro turno.

postado em 31/05/2025 08:55
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