
"O tsunami diplomático se aproxima, à medida que a Europa começa a agir contra a 'loucura completa' de Israel em Gaza", disse uma das manchetes do jornal liberal israelense Ha'aretz na última semana.
O título escolhido pelo periódico se refere à condenação internacional conjunta das ações de Israel em Gaza, que aconteceu na mesma semana do chocante assassinato de dois jovens funcionários da embaixada israelense em Washington.
Por tudo isso, essa foi, para dizer o mínimo, uma semana tumultuada para o Estado judeu.
As ondas do 'tsunami' começaram a cair nas costas de Israel na noite de segunda-feira (19/5), quando Reino Unido, França e Canadá emitiram uma declaração conjunta condenando suas ações "flagrantes" em Gaza.
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Todos os três países alertaram sobre a possibilidade de "novas ações concretas" se Israel continuar sua nova ofensiva militar e não suspender as restrições à ajuda humanitária.
Eles também ameaçaram "sanções específicas" em resposta à atividade de assentamentos de Israel na Cisjordânia ocupada.
Logo depois, 24 nações doadoras emitiram uma declaração condenando o novo modelo adotado por Israel para distribuir ajuda humanitária em Gaza.
Mas isso foi só o começo.
Na terça-feira, o Reino Unido suspendeu as negociações para um acordo de livre-comércio com Israel e afirmou que um roteiro de cooperação estratégica anunciado em 2023 seria revisto.
Uma nova rodada de sanções foi imposta contra colonos judeus, incluindo Daniela Weiss, uma figura proeminente que apareceu no recente documentário de Louis Theroux, The Settlers.
A embaixadora de Israel em Londres, Tzipi Hotovely, foi convocada para prestar esclarecimentos ao Ministério das Relações Exteriores britânico, uma medida geralmente reservada aos representantes de países como Rússia e Irã.
Para piorar a situação de Israel, a chefe de política externa da UE, Kaja Kallas, disse que a "grande maioria" dos membros do bloco é a favor da revisão do Acordo de Associação com Israel, de 25 anos.
'Basta'
As razões para essa enxurrada de condenações diplomáticas pareciam suficientemente claras.
As evidências de que Gaza está mais perto da fome em massa do que em qualquer outro momento desde o início da guerra, após o ataque do Hamas em outubro de 2023, causaram choque em todo o mundo.
A ofensiva militar de Israel e a retórica em torno dela sugeriam que as condições no território atingido estavam prestes a se deteriorar mais uma vez.
Dirigindo-se ao Parlamento na terça-feira, o secretário de Relações Exteriores do Reino Unido, David Lammy, destacou as palavras do linha-dura ministro das Finanças de Israel, Bezalel Smotrich, que falou em "limpar" Gaza, "destruir o que resta" e realocar a população civil para terceiros países.
"Devemos chamar isso do que é", disse Lammy. "É extremismo. Isso é perigoso. É repelente. É monstruoso. E eu o condeno nos termos mais fortes possíveis."
Smotrich não é um tomador de decisões quando se trata da condução da guerra em Gaza. Até agora, seus comentários incendiários poderiam ter sido postos de lado.
Mas esses dias parecem ter acabado. Certo ou errado, o primeiro-ministro de Israel, Benjamin Netanyahu, é visto como escravo de seus colegas de direita radical. Críticos o acusam de perseguir incansavelmente uma guerra, sem levar em conta a vida de civis palestinos ou os reféns israelenses restantes que ainda estão detidos em Gaza.
Países que há muito apoiam o direito de Israel de se defender estão começando a dizer "basta".
Esta semana foi claramente um momento significativo para o primeiro-ministro britânico, Keir Starmer, um defensor ferrenho de Israel, que enfrentou fortes críticas de dentro do Partido Trabalhista por sua relutância no ano ado em pedir um cessar-fogo em Gaza.
Na terça-feira, Starmer disse que o sofrimento de crianças inocentes em Gaza era "totalmente intolerável".
Diante dessa ação extraordinariamente combinada de alguns dos aliados mais fortes de seu país, Netanyahu reagiu furiosamente, sugerindo que o Reino Unido, a França e o Canadá eram culpados de apoiar o Hamas.
"Quando assassinos em massa, estupradores, assassinos de bebês e sequestradores agradecem, você está do lado errado da justiça", ele postou no X.
"Você está do lado errado da humanidade e está do lado errado da história."

O ministro das Relações Exteriores de Israel, Gideon Sa'ar, foi mais longe, sugerindo que havia uma "linha direta" entre os críticos de Israel, incluindo Starmer, e o assassinato de Yaron Lischinsky e Sarah Lynn Milgrim, os dois funcionários da embaixada israelense mortos a tiros em frente ao Museu Judaico em Washington.
Mas, apesar das demonstrações de apoio recebidas após o ataque, o governo israelense parece cada vez mais isolado, com aliados ocidentais e membros proeminentes da diáspora judaica expressando raiva — e angústia — pela guerra em Gaza.
Lord Levy, ex-enviado para o Oriente Médio e conselheiro do ex-premiê britânico Tony Blair, disse que endossou as críticas do atual governo, até mesmo sugerindo que elas poderiam ter chegado "um pouco tarde".
"Tem que haver uma posição, não apenas nossa neste país, mas internacionalmente, contra o que está acontecendo em Gaza", disse ele ao programa The World at One, da BBC Radio 4, descrevendo-se como "um judeu muito orgulhoso... que se preocupa apaixonadamente por Israel".
Mas apesar de tudo isso, o único homem que poderia, se quisesse, parar a guerra, permanece em silêncio.
No final de sua recente turnê pelo Golfo, Donald Trump disse que "muitas pessoas estão morrendo de fome".
Autoridades da Casa Branca indicaram que o presidente dos EUA estava frustrado com a guerra e queria que o governo israelense "a encerrasse".
Mas enquanto outros líderes ocidentais expressam sua indignação publicamente, Trump faz poucos comentários sobre o tema.
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